sábado, 25 de outubro de 2008

Chamem o estado!











Após a queda da URSS, os “profetas” ultraliberais proclamaram o fim da história, e a consequente instauração da democracia e do mercado em todo o mundo, e prescreveram ao estado o papel de mero regulador da actividade económica. 
Desde o final do século passado até ao presente, a globalização avançou a todo o vapor, com a deslocalização de empresas de uns países para outros, em busca de maiores lucros e mão-de-obra mais barata.
Na opinião deles o estado ocupava-se de demasiadas coisas, por isso exigiram que a saúde e a educação deviam ser pagas, e os fundos de pensões dos trabalhadores investidos na bolsa e geridos pelo sector privado! O estado tal como o tínhamos conhecido era um anacronismo, devia ser reduzido às suas funções mínimas. Os governos de direita e de esquerda (neoliberais e socialistas de 3ª via) corresponderam ao repto e privatizaram aceleradamente os recursos públicos. 
Em suma, aos poucos instaurou-se uma ideologia que diaboliza o estado, o serviço público, a preservação do meio ambiente, e idolatra o dinheiro e a ostentação que o mesmo proporciona.
Paralelamente, as guerras imperialistas agudizaram-se com a ocupação do Afeganistão, do Iraque, fragmentação da Jugoslávia, o bombardeamento da Sérvia e o reconhecimento recente da independência do Kosovo, ao arrepio do direito internacional público.
Por outro lado, graças às políticas neo-liberais dos governos, Reagan/Thatcher, Bush/Blair/Schroder, a desregulamentação dos mercados financeiros intensificou-se, permitindo-se que a banca investisse o dinheiro dos depositantes em negócios arriscados, concedendo crédito a particulares para adquirirem casas muito acima das suas possibilidades, e “democratizando” o crédito desenfreado ao consumo.
Como o que interessava era a remuneração cada vez maior do capital, descurou-se o factor trabalho, e quando o desemprego aumentou as pessoas tiveram de entregar as casas hipotecadas, aumentando assim o crédito malparado, pelo que o capital na sua busca incessante de lucros cada vez maiores chegou a um beco sem saída, pois o “esquema Dª Branca” funcionou enquanto a base da pirâmide conseguiu pagar as prestações dos seus créditos.
Neste quadro, durante anos a fio os gestores de topo auferiram vencimentos astronómicos, e reformas milionárias, cujo o caso mais escandaloso, em Portugal, foi o do Conselho de Administração do BCP, nos consulados Jardim Gonçalves/Paulo Teixeira Pinto, aumentando exponencialmente o fosso entre dirigentes e trabalhadores, de tal forma que na UE os primeiros ganham quinze vezes mais que os segundos, e em Portugal a diferença é de trinta vezes mais.
Nos últimos tempos, a especulação financeira atingiu o auge, agravada com a subida galopante do preço do crude, e dos bens alimentares, e para nosso espanto, a bolha rebentou e não foi possível disfarçar mais e impingir “produtos tóxicos” a outros bancos e a outros países – como é o caso da Islândia à beira do precipício.
Com a crise, a regra de ouro do sistema quebrou-se: os bancos não confiam uns nos outros e não emprestam dinheiro entre si! Sem confiança a economia não funciona! Repentinamente o estado, até há bem pouco tempo tão vilipendiado, foi chamado a pagar a factura, como se viu nas últimas semanas nos EUA e em vários países da UE!Perante toda gente ficou claro que os adeptos encarniçados do mercado já não acreditam nele, perderam a fé nas virtudes do mesmo. Supostamente o mercado deveria auto-regular-se, e os bancos fraudulentos irem à falência, e serem adquiridos por outros melhor administrados. 
Mas, tal não aconteceu, e o sector financeiro à beira do colapso exigiu aos governos, cujas campanhas eleitorais eles financiaram, a concessão de garantias milionárias, e a entrada na sua estrutura accionista.
Ora, o pecado mortal deste capitalismo de casino, como alguns lhe chamam, foi ter transferido o risco da banca, e dos governos, para as famílias e os contribuintes, aboletando-se com os lucros no tempo das vacas gordas, e endossando o prejuízo ao zé-povinho, quando a crise estalou, com a complacência dos governantes.Agora os ideólogos do costume escrevem editoriais, nos respectivos jornais, apelando à ética e á regulação do mercado por parte das entidades pública, numa tentativa de fazer tábua rasa do passado. 
Porém já não se trata de ética, mas de aplicar a lei penal aos gestores que conduziram as sociedades financeiras ao caos; trata-se de investigar como é que foi possível chegar a este estado de coisas, e identificar as políticas que o permitiram, pois não é lícito que os responsáveis pelo presente estado de coisas gozem arrogantemente as suas reformas milionárias à custa da diminuição das condições de vida de milhões de pessoas, sobretudo nos casos em que as respectivas empresas se tornaram insolventes.